sexta-feira, 12 de julho de 2013

DEPRESSÃO INFANTIL


* Por Jorge Roberto Fragoso Lins

Ao contrário do que se imagina a depressão não é um mal relacionado apenas a adultos, estima-se que cerca de 2% das crianças apresentam ou já apresentaram sintomas depressivos. Entender e diagnosticar a depressão infantil não é nada fácil, pois os sintomas poderão ser confundidos como birra, malcriação, mau humor, agressividade e finalmente tristeza. Ficar triste é uma decorrência da vida que os seres humanos em muitos momentos da existência vivenciam por esse ou aquele motivo, mas o que vai sinalizar para uma depressão é a intensidade e persistência dessa tristeza que culminará numa mudança de hábitos da criança. Hábitos que antes eram naturais do dia-a-dia aos poucos vão ficando sem graça e deixados de lado.

Geralmente a depressão se apresenta após uma experiência traumática como separação dos pais, morte de uma pessoa querida ou mesmo de um animal de estimação, bullying, mudança de colégio ou uma mudança radical de vida que a desestruture em suas referências. No entanto, a depressão poderá ocorrer ainda na primeira infância estando relacionada a frustrações precoces e graves ligadas a qualidade do investimento materno. O empobrecido investimento libidinal da mãe no papel do Outro primordial da criança, a falta de desejo dessa mãe, a ausência da palavra amorosa (desejante) e talvez uma possível representação de intrusão vista em relação a esse bebê, poderão acarretar em sérias consequências para o circuito pulsional da criança, podendo não apenas provocar uma depressão como coisa pior. Uma boa interação mãe-bebê ou, o encontro mãe-bebê é de suma importância para o desenvolvimento do mesmo, e a isso já enfatizava Winnicott quando dizia:


"Sem ter alguém dedicado especificamente às suas necessidades, o bebê não consegue estabelecer uma relação eficiente com o mundo externo. Sem alguém para dar-lhe gratificações instintivas e satisfatórias, o bebê não consegue descobrir seu próprio corpo nem desenvolver uma personalidade integrada".


O processo de evolução do desenvolvimento neuro motor e psíquico da criança iniciam, assim que ela nasce, e será através dos cuidados maternais e da afetividade que a mãe passa para seu filho, a somar a uma boa relação do casal ou familiar e ao ambiente externo sem muitas intrusões que invadam a intimidade do bebê, que propiciará um desenvolvimento harmonioso e sadio para o mesmo, obviamente, incluindo os fatores genéticos favoráveis para tal.

Será através da mãe que a criança entrará no campo das representações, ou seja, no campo do simbólico, sendo a mãe a primeira a decodificar os primeiros signos para a criança, nomeando seu choro a alguma necessidade. Segundo Winnicott, no último trimestre gestacional a mãe desenvolve um estado psicológico especial denominado por ele de “preocupação materna primária”. O que isso significa? Que a mãe adquire uma acentuada sensibilidade nos períodos pós parto e puerperal, conseguindo, assim, identificar e diferenciar as necessidades físicas do bebê como também, a necessidade que o bebê tem de reconhecer o que o rodeia. Isso explica o que mencionei antes sobre a nomeação que a mãe faz do choro do bebê a alguma necessidade dele.

É uma relação que exige alienação por parte do bebê e dedicação por parte da mãe, existindo, assim, uma identificação de ambas as partes. Aspectos qualitativos do investimento maternal poderão ser quebrados, por exemplo, por uma forte vivência de luto que a mãe esteja passando, descompensações depressivas. A isto, temos a dizer que o nível de exposição da criança com a mãe depressiva também concorre para o desenvolvimento do quadro na criança. A falta de continuidade dos cuidados, vivência de separação da mãe ou de seu cuidador ou cuidadora, também são extremamente significativos para a formação do quadro. Mas, vale salientar que, antes dos seis meses de vida do bebê não se cogita em dizer que exista uma depressão, mas respostas depressivas. No entanto, no segundo semestre, ocasionada pela ruptura da relação com o objeto maternal, a criança poderá desenvolver um quadro precoce e bastante grave de depressão, chamada de depressão anaclítica. É uma depressão infantil precoce que provoca um severo prejuízo no desenvolvimento físico e psíquico das crianças que são negligenciadas pelas mães.

A criança apresenta um quadro de perda gradual de interesse pelo meio, perda de peso, comportamentos estereotipados (tais como balanceios) e, eventualmente, a morte. Com a manutenção da negligência da mãe o quadro será intensificado e o bebê irá desistir de seus apelos quando sentir suas necessidades, podendo também desenvolver um quadro de autismo, segundo a psicanálise. Um exemplo que caracteriza o que estou mencionando é o da depressão pós-parto. O bebê chora de fome e a mãe não tem forças para alimentá-lo. Neste caso não é que exista uma negligência proporcional, mas existe uma indisposição que irá se equiparar a uma negligência ou, melhor dizendo, a consequência dela. É importante lembrar que a mãe ao ocupar a função do Ego de suporte de seu bebê, deverá não só compreender suas necessidades e acolhê-lo em todas elas, mas também ser sensível observando como o bebê ou a criança mais velha reage ao meio externo (evitando intrusões), criar as condições necessárias para um ambiente saudável e alegre em todas as etapas do desenvolvimento de seu filho. Os primeiros meses e anos de vida do indivíduo são extremamente importantes para sua constituição. Falhas ou ineficiência no contato mãe-bebê poderá acarretar prejuízos cognitivos e alterações de personalidade que perdurará até a vida adulta.

O diagnóstico de depressão infantil é normalmente feito a partir de critérios de comportamento, tais como: atonia afectiva, inércia motora, pobreza interactiva/retirada, desorganização psicossomática (Kazdin, 1990).

A depressão infantil é avaliada em detrimento de sua duração e das falhas funcionais que a acompanham. Encontram-se, também, sintomas associados, como perturbações do comportamento, défices de atenção, falta de vivacidade na expressão dos afetos, falta de apetite, desânimo para desenvolver suas competências relacionais e cognitivas, isolamento, irritabilidade, hiperatividade, cefaleia, dores de estômago e outros. Segundo Fábio Barbirato, crianças em idade pré-escolar (até 5 anos) tendem a desenvolver sintomas como melancolia, enurese (xixi na cama), encoprese (eliminação de fezes involuntária) e crises de choro. Também podem ocorrer regressão no desenvolvimento psicomotor, insônia e pesadelos. 

O Manual de Estatística e Diagnóstico de Transtornos Mentais determina a necessidade de identificar pelo menos cinco dos treze sintomas, com durabilidade de duas semanas, para comprovação do quadro.


1. Alteração de humor, com irritabilidade e ou choro fácil
2. Ansiedade
3. Desinteresse em atividades sociais, como ir a escola, brincar com os amigos ou com brinquedos
4. Falta de atenção e queda no rendimento escolar
5. Distúrbios de sono, como dificuldade pra dormir ou ter sono o dia inteiro
6. Perda de energia física e mental
7. Reclamações por cansaço ou ficar sem energia
8. Sofrimento moral ou insatisfação consigo mesmo, sentimento de que nada do que faz está certo
9. Dores na barriga, na cabeça ou nas pernas
10. Sentimento de rejeição
11. Condutas antissociais e destrutivas
12. Distúrbios de peso, emagrecer ou engordar demais
13. Enurese e encoprese (xixi na cama e eliminação


A depressão infantil tem seu início insidioso, ou seja, sorrateiramente, apresentando múltiplos sintomas. É preciso que a criança apresente pelo menos cinco sintomas referentes ao quadro para se confirmar o diagnóstico. Os pais, sobretudo, a mãe, devem observar mudanças significativas ou não de comportamento de seu filho, como também, reavaliar sempre seus próprios  comportamentos em relação a criança. Segundo Winnicott, a mãe é a responsável pela saúde psíquica de seu filho, ou seja, sendo uma boa mãe ela propiciará um harmonioso e saudável desenvolvimento para seu filho. No entanto, o pai, como balizador dessa relação, como castrador do gozo da mãe e como o sujeito que irá inscrever a falta, o limite, a lei ao filho, deverá compartilhar imensamente da responsabilidade de educar, mas, sobretudo, de ser um bom pai. Ser uma boa mãe ou um bom pai não é ser um indivíduo que não erra, pois isso é impossível, mas apenas ser uma boa mãe ou um bom pai. O que isso significa? Sua consciência, assim, o dirá!  

* Jorge Roberto Fragoso Lins é sociólogo, pós-graduado em intervenções clínicas em psicanálise, graduando do 8º período de psicologia.


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