* Por Jorge Roberto Fragoso Lins
O
bebê se encontra inteiramente dependente de sua mãe para realizar suas
necessidades, e será através dela, ou seja, desse Outro primordial ou de quem
ocupe este lugar que a criança construirá sua integração como unidade. Na
medida em que a integração do infante vai se tornando mais consistente, seu
amadurecimento exigirá algo do mundo externo que se faça presente e se misture a
sua onipotência, ou seja, um objeto transicional que cumprirá também o papel de
indicar o simbólico, um instrumento que possibilita a travessia do bebê desde a
sua subjetividade até a objetividade, abrindo, assim, o leque de suas
experimentações. Em outras palavras, o objeto transicional é um instrumento que
conduz o bebê rumo a um Não-eu que ele sentirá como externo, provocando sua
primeira experiência de posse sem ser a do seio materno, mesmo porque para o
bebê nessa fase seu corpo se confunde com o corpo da mãe sendo um só corpo.
Segundo
Winnicott, o objeto transicional é eleito pelo bebê por volta dos 4-6-8-12
meses de idade, e a capacidade de adotá-lo denota que o andamento de seu desenvolvimento
está em curso. A partir daí observam-se algumas mudanças e a principal delas é a
de que o bebê está passando de uma dependência absoluta para uma dependência relativa,
preparando terreno para o estágio do concernimento. Neste estágio a integração
do ego já atingiu um grau em que o indivíduo pode perceber a personalidade da
figura materna, tendo como consequência o sentimento de concernimento quanto
aos resultados de suas experiências instintivas, tanto físicas quanto ideativas,
ou seja, o estágio de concernimento traz a capacidade para a criança de sentir
culpa.
O
bebê que está passando de uma dependência para outra pode se tornar consciente da
necessidade dos detalhes do cuidado maternal e relacioná-los, numa dimensão crescente,
a impulsos pessoais.
Os objetos transicionais exercem a função de amparo ao substituírem a
mãe, e é quase uma parte inseparável da criança, marcando o início da quebra da
unidade mãe-bebê. Winnicott salientou três realizações fundamentais relativas a progressão da dependência absoluta para a
dependência relativa, são elas: a integração, a personificação e o início das
relações objetivas.
É
na fase da dependência relativa que o bebê vai experienciar estados de
integração e não integração, formar conceitos de Eu e Não-eu – mundo interno e
interno – e o amadurecimento necessário para o estágio de concernimento. Winnicott
também chamou a fase da dependência relativa de rumo à independência, e é justamente
isso que essas fases representam, o fomento de proporcionar a independência da criança frente à sua mãe. O
bebê vai desenvolver meios para prescindir dos cuidados da mãe, ou seja, não
será tão dependente quanto antes. Mas isso só ocorrerá caso exista nitidamente
para o bebê a memória dos cuidados que a mãe teve com ele, da projeção das
necessidades pessoais com a introjeção do cuidado maternal e com o
desenvolvimento da confiança no ambiente.
Os
objetos transicionais pode ser um pano que esteja próximo ao bebê, o lençol, a
chupeta, um boneco ou boneca, e outros. Conforme Winnicott, quando o bebê passa
a usar sons organizados (mmmm, tá, dá), pode aparecer uma ‘palavra’ para o
objeto transicional. O nome dado pelo bebê para esses objetos iniciais é
frequentemente significativo, e normalmente traz incorporada a parte de uma
palavra usada pelos adultos. Por exemplo, o nome pode ser ‘Baa”, o ‘b” sendo
parte da palavra ‘bebê’.
Winnicott
faz uma observação que provavelmente irá afetar muitas mães com traço obsessivo por limpeza. No entendimento de
Winnicott, a mãe não deve lavar o pano ou lençol ou qualquer que seja o objeto
transicional, deixando até mesmo ficar malcheiroso. O autor argumenta que se o
objeto for lavado haverá uma ruptura na experiência do bebê, uma quebra que
poderá destruir o valor e o significado do objeto. E para o caso de querer trocar
o objeto por outro igual não adianta, pois por mais que seja idêntico não produzirá
o mesmo efeito. Outra importante função do objeto transicional é o de ajudar no
desmame já que aos poucos vai existindo o descolamento mãe-bebê.
O
destino do objeto transicional é que gradualmente vá sendo descatexizado, de
modo que no decorrer dos anos ele se torne relegado ao limbo. Não quer dizer
que o objeto transicional seja esquecido pelo indivíduo e nem tampouco que
exista a vivência de um luto, mas simplesmente ele perde o sentido de antes
para se tornar fenômenos transicionais difusos que irão responder pela
realidade psíquica e o mundo externo de modo bem mais complexo do que antes e
bem mais amplo, sejam bem-vidos a fases mais maduras do ser humano.
* Jorge Roberto Fragoso Lins é sociólogo, pós-graduado em
intervenções clínicas em psicanálise e graduando do 8º período de psicologia.
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